Carta Aberta para recuperar o ambientalismo

Por favor leia a carta abaixo, e junte-se a outros 1934 abaixo-assinados.

Read in English, Lire en français, Auf Deutsch lesen, Leer en español, Citește în română

Uma vez, o movimento ambientalista se dedicava à proteção do mundo natural contra a demanda insaciável desta cultura extrativista. Parte desse movimento segue assim: ao redor do mundo todo os ativistas de base e suas organizações lutam desesperadamente para salvar uma ou outra criatura que amam, uma ou outra planta ou fungo, um ou outro ambiente selvagem. .

Agora contraste isso com o que alguns ativistas estão chamando de complexo de conservação-industrial – grandes organizações verdes, enormes fundações “ambientais”, neo-ambientalistas, alguns acadêmicos – que têm cooptado muito com o movimento para a “sustentabilidade”, palavra cujo sentido é desvalorizado para significar “mantenha essa cultura o máximo de tempo possível”. Ao invés de lutar para proteger nosso único lar, eles estão tentando “sustentar” a própria cultura que está matando o planeta. E eles costumam ser explícitos sobre suas prioridades.

Por exemplo, a recente publicação “Uma Carta Aberta aos Ambientalistas Sobre a Energia Nuclear”, assinada por um número de acadêmicos, alguns biólogos conservacionistas e outros membros do complexo de conservação-industrial, qualifica a energia nuclear como “sustentável” e argumenta que devido ao aquecimento global, a energia nuclear possui um “papel fundamental” na “consercação da biodiversidade mundial”. Todo o seu argumento baseia-se na presunção de que o uso industrial de energia é, como disse Dick Cheney[1], não negociável, é tomado como dado. E para que se utilizará essa energia? Para continuar a extração e o declínio – para converter as últimas criaturas vivas e suas comunidades em mercadorias mortas.

A carta diz que devemos deixar a “evidência objetiva” ser nosso guia. Um sinal de inteligência é a habilidade de recohecer padrões: Então vamos descrever um padrão e ver se podemos reconhecê-lo em menos de 10.00 anos. Quando você pensa no Iraque, você pensa em florestas de cedro tão densas que a cobrem toda a luz do sol? Lá era assim antes do início desta cultura. O Oriente Médio era uma floresta. O norte da África era uma floresta. A Grécia era uma floresta. Tudo foi derrubado para dar suporte a essa cultura. A floresta nos precede, enquanto os desertos seguem nossos passos. Haviam tantas baleias no Atlântico que elas eram um perigo para os navios. Haviam tantos bisões nas Grandes Planícies (EUA) que uma manada podia durar quatro dias para passar. Havia tanto salmão no noroeste do Pacífico que você podia ouvir eles horas antes de eles chegarem. A evidência não é somente “objetiva”, é massiva: esta cultura esgota a água, a terra, as espécies e o próprio processo de vida, até restar somente o pó.

Combustíveis fósseis aceleraram essa destruição, mas não a causaram, e trocar combustíveis fósseis para energia nuclear (ou eólica) e não vai parar isso. Talvez três gerações de humanos vão experienciar esse nível de consumo, mas uma cultura baseada no esgotamento não tem futuro. De todas as pessoas, biólogos conservacionistas deviam entender que esse esgotamento não pode durar, e não deviam levar isso como dado no design de políticas públicas — e muito menos um estilo de vida.

Já passou da hora para aqueles de nós cujas lealdades pertencem às plantas e aos animais e seus ambientes de retomar nosso movimento daqueles cuja retórica é promover a aceleração do ecocídio. Já passou do tempo de todos encararem o fato de que esse estilo extrativista não tem e nunca teve futuro, e somente pode terminar num colapso biótico. Todos os dias a cultura extrativista continua, duzentas espécies caem naquela longa noite de extinção. Nós resta pouco tempo para parar a destruição e iniciar o conserto. O reparo pode ser feito: As pastagens, por exemplo, são tão boas na captura de CO2 que recuperar 75% das pradarias poderia levar o CO2 atmosférico pra menos de 330 ppm em quinze anos ou menos. Isso também recuperaria o ambiente de uma quantidade quase infinita de criaturas. Podemos também utilizar argumentos semelhantes sobre o relorestamento. Ou considerar que das mais de 450 zonas mortas nos oceanos, precisamente uma se recuperou. Como? O colapso da união Soviética tornou a agricultura inviável na região próxima ao Mar Negro: com a atividade destrutiva removida, a zona morta desapareceu, e a vida retornou. Simples assim.

Você pensaria que aqueles que clamam importar-se com biodiversidade cuidariam da “evidência objetiva” dessa forma. Mas ao invés disso o complexo de conservação-industrial promove energia nuclear (ou eólica). Porque? Porque recuperar pradarias e florestas e acabar com impérios não se encaixa na agenda de extração dos senhores globais.

Essa e outras tentativas de racionalizar desesperadamente os meios para abastecer essa cultura destrutiva é francamente insano. O problema fundamental que nós enfrentamos como ambientalistas e seres humanos não é tentar encontrar um meio de energizar essa destruição um pouco mais: e sim parar de destruir. A escala dessa emergência desafia seu significado. Montanhas estão caindo. Os oceanos estão morrendo. O clima em si está sangrando e o que nossas crianças vão descobrir está além da esperança. A única certeza é que nossa única e singular casa, uma vez exuberante com a vida e as promessas de mais, será logo uma grande rocha exposta se não fizermos nada.

Nós abaixo-assinados não somos parte do complexo de conservação-industrial. Muitos de nós somos ativistas ambientais de longa data. Alguns de nós somos povos indígenas cujas culturas foram viver de maneira verdadeiramente sustentável e respeitosa com todas nossas relações desde muito antes do começo da exploração do planeta pela cultura dominante. Mas todos nós somos seres humanos que reconhecemos que somos animais que como qualquer outro precisamos de habitats em uma terra viva. E nós amamos o salmão e as pradarias e as andorinhas negras e a natureza selvagem mais do que amamos este modo de vida.

Ambientalismo não se trata de isolar essa cultura dos efeitos das atividades destruidoras do mundo. Nem se trata de perpetuar essas atividades. Nós estamos reivindicando ambientalismo para proteger de fato o mundo natural dessa cultura.

E o mais importante, nós amamos essa terra, e vamos defender nossa amada.

Footnote:
[1] Dick Cheney: vice-presidente, republicano dos EUA, durante o mandato Bush.